As Formas do Espaço Brasileiro – Pedro Geiger

Por Marcos Bau em Fev. 2017.

Sobre o livro de Pedro Geiger ‘As formas do espaço brasileiro’… Comecei a ler, (re)pensar e refletir sobre questões, além de associá-las ao momento de país que estamos passando… Então, comecei a escrever…

As maiores metrópoles do Brasil estão no mesmo fuso horário e o ritmo diurno sincrônico permitiu ao rádio e à televisão exercerem um papel singular na homogeneização cultural do povo brasileiro. As telenovelas impuseram uma carga ideológica que isentou/isenta o povo da devida criticidade.

O movimento centrífugo que impediu o sonho de Bolívar, de unificar a América espanhola em Estados independentes de um só país, também serve como exemplo pra nós, que temos um território muito extenso e com vazios demográficos em centros populacionais fracamente conectados. Ratzel dizia que um povo que não tem enraizamento com seu chão/solo/território perde o sentido de nação, e o maior problema para a governabilidade é a falta de nacionalismo da população que vive em regiões distantes e desconectadas (verdade que nossa falta de nacionalismo é também por outras questões mais fortes).

Nas Américas, as nações foram constituídas por Estados independentes de população de diversas origens, onde a naturalização dos imigrantes era prontamente aceita. Aos filhos dos imigrantes também era assegurada a plena cidadania, diferente do que acontecia na Europa. A diferença que temos dos EUA está nas bases das guerras de independência e de secessão deles. A analogia de Ratzel também serve nesse parágrafo.

A monarquia brasileira não conseguiu a devida unidade do país, vide que nos 67 anos que vigorou até a República, mais de dez levantes de cunho republicano e nacionalista aconteceram. Bem verdade que, até a Farroupilha que durou uma década, foi iniciada no Primeiro Reinado, mas nem o Reinado de Dom Pedro II conseguiu conter nosso primeiro golpe militar que instaurou a República (o imperador abolicionista até que tentou avanços sociais, mas conciliar os anseios da igreja, da elite cafeeira e dos militares não foi possível). Daquele primeiro golpe republicano sempre achamos que resolveremos tudo através de outros golpes de Estado… Indico link ao final desse escrito que descreve todos os nossos golpes.

A manutenção da coesão territorial se deu pela força do barroco na cultura brasileira, ou seja, por meio da corrente da fé e das festas que realiza a magia aglutinadora. Uma ideia de que a fragmentação atual poderia ser pior se não fosse pela fé, mas, no geral, a aglutinação dessa forma também não trouxe a devida criticidade ao povo.

Ilha de Vera Cruz, Terra de Vera Cruz e Ilha de Santa Cruz foram os primeiros nomes que não vigoraram, mas, em 1527, prevaleceu o nome de Brasil devido ao nobre pau-brasil, que soltava uma tinta avermelhada para tingir as roupas dos aristocratas europeus. “Brasileiros” eram os envolvidos no comércio de pau-brasil, ou seja, a única relação que eles tinham com nosso território; o contrabando. Brasileiros hoje são os que aqui tentam compor uma nação pelo enraizamento que não aconteceu em tempos de outrora. Daí Milton Santos dizer que não temos cidadãos no Brasil, pois a classe média não quer direitos, mas privilégios.

Nossos maiores ciclos agrícolas foram de produtos trazidos de outros continentes pra cá, como a cana e o café. Da borracha, que foi extraída de plantas nativas da Amazônia, respondemos hoje por menos de 3% da produção mundial, pois levaram nossas mudas para a Malásia e a Indonésia, e é lá que a produção mundial acontece desde o século passado… Até nisso somos contraditórios.

Curioso também é que até meados do século passado, boa parte da corrente de imigrantes era para a agricultura; impedia-se imigrantes de origem urbana. Essa é da parte da oligarquia rural atrapalhando nosso desenvolvimento industrial (se dependesse deles ainda seríamos um país escravagista).

Aqui vai um trecho literal: “a estrutura social [até meados do século XX] era dominada pela divisão entre dois setores. Um era formado, no campo, pelos detentores de terras próprias ou alugadas, e na cidade, por uma pequena elite e classe média de profissionais liberais e funcionários públicos. O outro era composto pela enorme massa pobre de trabalhadores braçais.” Me diz o que mudou em relação ao século XXI. Quase nada, né?!

O primeiro governo Vargas utilizou a cidade para criar uma massa crítica de trabalhadores urbanos a servir como sua base e sustento político. Em JK, o Estado induziu a entrada de empresas multinacionais e a construção de Brasília marca o começo do desmonte da simbologia estatista. O Estado ali se atrelou mais ao capital privado, nacional e estrangeiro. O regime militar transformou a cidade em controle social ao implantar grandes empresas de serviços e de infra-estrutura em diferentes escalas, no intuito de incentivar a desconcentração industrial e uma maior difusão do capitalismo no território nacional. Crescemos economicamente (a dívida externa também cresceu astronomicamente!), mas a falta de projetos sociais – na chamada “modernização conservadora” – aprofundou as fissuras sociais e a correspondente fragmentação territorial, além da tendência das pessoas se dedicarem a atividades mais solitárias do que as compartilhadas e públicas.

Até hoje nossa classe política não entendeu que a nação transcende o território e o imprescindível é o povo, o conteúdo maior do país. No Brasil, o Estado antecedeu a nação e assumiu papel condutor, inclusive na construção da própria nação. Em suma, uma nação sem consistência é um território sem cidadania. Enfim, o que somos e o que temos pra hoje.

O link sobre os golpes ===> http://marcosbau.com.br/geografia-do-brasil/breve-analise-cabral-nova-republica/