O Brasil vai exportar petróleo?


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O mundo movido a petróleo

Entenda o Pré-sal

Alvo constante de especulações, o combustível fóssil mantém preços altos, enquanto as reservas mundiais se aproximam do limite. Na contramão, o Brasil descobre enormes jazidas.

Depois de comemorar, em novembro de 2007, a descoberta do campo petrolífero de Tupi (que a partir de 2013 deve tomar o Brasil exportador de petróleo) e, dois meses depois, anunciar a descoberta da jazida de Júpiter (que pode tornar o país auto-suficiente em gás natu­ral), a Petrobras veio a público reclamar de um furto de informações considerado ato de espionagem industrial. No fim das contas, a Polícia Federal considerou que foi apenas um simples roubo de laptops.

Mesmo que tenha havido certo exage­ro, faz sentido a paranóica preocupação da Petrobras em manter um sigilo estra­tégico sobre as novas frentes de extração de petróleo e gás. Afinal, a descoberta do campo de Tupi, na bacia de Santos, a 180 quilômetros do litoral paulista, é considerada a maior já feita no país.

O novo campo tem potencial de produ­ção entre 5 bilhões e 8 bilhões de barris de petróleo, respectivamente cerca de 50% ou 60% das reservas brasileiras atuais, que são de 14 bilhões de barris. O petróleo encontrado é leve, de melhor qualidade do que aquele que o Brasil explorou até agora, e por isso seu valor comercial é maior.

O problema é que ele está a 6 mil metros abaixo da superfície, sob uma placa de sal – chamada camada pré-sal. Isso significa que serão necessários grandes investimen­tos na exploração da jazida. A instalação de um poço em águas ultraprofundas pode custar até 4 bilhões de dólares, quatro vezes mais do que se estivesse em águas profundas. A Petrobras pretende começar a extrair petróleo de Tupi em 2013 e con­sidera que a região tem enorme potencial – estudos futuros devem chegar a outros campos que, juntos, poderão produzir até 70 bilhões de barris.

Na mesma região, foi encontrada em ja­neiro a jazida de gás natural de Júpiter. Não se sabe ainda sua grandeza, mas estima-se que seja similar à de Tupi, já que ambas têm áreas semelhantes, cerca de 1,2 mil quilômetros quadrados. Se essa informação for confirmada, o novo campo tornará o Brasil auto-suficiente em gás.

Petrobras entre as 20 maiores

O Brasil atingiu em 2006 a auto­suficiência em petróleo, com a produção de 1,8 milhão de barris por dia. Essa noticia signi­fica, de forma simples, que o Brasil produz todo o petróleo de que precisa. Na prática, é um pouco mais complicado, pois o país continua a importar petróleo – ao mesmo tempo em que exporta. Isso ocorre porque parte do que é extraído aqui não é do tipo mais adequado às nossas refinarias. Assim, é preferível comprar fora o que mais nos convém e vender nosso petróleo para refino em outros países. Numa definição mais precisa, a auto-suficiência significa que os ganhos com a exportação de petróleo hoje ainda não são maiores do que os gastos com a importação. Em resumo, a alardeada auto-suficiência divulgada pelo governo em 2006 estava mais ligada à reeleição presidencial de Lula do que ao superávit na balança petrolífera propriamente dita. A Petrobras afirmou que a tão esperada (e avisada antes da hora) auto-suficiência virá em 2014 (fonte: Folha de São Paulo).

Antes da descoberta do campo de Tupi (veja figura que segue), calculava-se que o Brasil possuísse reservas consideráveis para manter a auto-suficiência até 2020, mes­mo com uma previsão de aumento do consumo de 3% ao ano.

Reserva Tupi no pré-sal. Fonte: Fonte: Revista atualidades vestibular, 2009, p. 53.

Esse resultado é fruto de meio século de trabalho da Petrobras, criada em 1953 para desenvolver a indústria petrolífera no Brasil. A empresa é, atualmente, a sétima maior do planeta em produção e a sexta em volume de reservas. No conjunto das companhias petrolíferas, destaca-se entre as 20 maiores. A maior parcela de extra­ção brasileira ocorre em solo marítimo (veja figura que segue) por meio de plataformas, e a Petrobras tornou-se uma das líderes mundiais na tecnologia desse tipo de exploração.

Escassez

Essas notícias ganham mais importân­cia para o Brasil se considerarmos que em todo o planeta cresce a preocupação com o acesso às fontes de energia, em especial ao petróleo e ao gás natural. O petróleo – e seu congênere, o gás natural – responde por mais de 50% da energia consumida no globo. Em segundo lugar vem o carvão natural, com 23,2%. Somen­te depois, bem atrás, aparecem a energia nuclear (6,5%) e a hidrelétrica (2%).

Para os meios de transporte, o petró­leo é disparado o principal combustível. Cerca de 96% dos veículos existentes no planeta são movidos com derivados do petróleo, como a gasolina, o óleo diesel e o querosene. O petróleo é usado também na geração de eletricidade, além de servir de matéria-prima para uma infinidade de produtos, como plásticos, fertilizantes e tecidos sintéticos. Sua falta pode provocar a estagnação da economia mundial, como ocorreu em 1973, no “choque do petróleo”. Naquela ocasião, a Arábia Saudita e outros produtores árabes suspenderam as remes­sas para os Estados Unidos e para países europeus, em represália ao apoio ociden­tal a Israel na Guerra do Yom Kippur. O fornecimento foi logo estabelecido, mas a preços muito superiores (um aumento de 800% em poucos meses), o que provocou uma recessão global.

Preço do petróleo relacionado com as crises, guerras e revoluções.

Combustível do poder

Em contrapartida, os governantes de países com grandes reservas de petróleo, como a Federação Russa, o Irã e a Ve­nezuela, têm mostrado uma disposição crescente de fazer uso desses recursos para ampliar sua influência política in­ternacional. Em 2006, o presidente da co­missão de relações exteriores do Senado norte-americano, o republicano Richard Lugar, enfatizou a importância estratégi­ca do petróleo, observando que “o poder de coerção energética é equivalente a um ataque nuclear”. Com apenas 2% das reservas mundiais e 5% da população do globo, os EUA consomem 25% de todo o petróleo produzido no planeta (veja figura que segue).

Em  2006, o mundo gastou mais de 80 milhões de barris de petróleo por dia. De acordo com as projeções da Agência In­ternacional de Energia (AIE), o consumo continuará crescendo, sem parar, a uma taxa anual de 1,7% nos próximos 25 anos. Nesse ritmo, em 2030 o mundo precisará de 121 milhões de barris diários para aten­der a suas necessidades de energia — 50% a mais do que atualmente.

Grande parte desse aumento de consumo é causada pelo elevado crescimento econô­mico de países emergentes, como a índia e, sobretudo, a China. Até 1993, a China era um país auto-suficiente em combustíveis. Em 2006, se tornou um respeitável importador e, desde então, tem ampliado seu consumo de petróleo a uma taxa de 3,4% ao ano – o dobro da média mundial. O principal motivo para a expansão tão vigorosa é o aumento na venda de carros. A China possui o mercado de automóveis que mais cresce no planeta, com uma frota que cresce 9% ao ano.

A maioria dos especialistas e as próprias empresas estão convencidas de que, man­tidos os atuais padrões de consumo, as re­servas disponíveis de petróleo não darão conta da demanda no médio prazo. Como confirmou a multinacional ExxonMobil, num relatório de 2005, o nível global das reservas de petróleo está diminuindo desde a década de 1960. Atualmente, cerca de 100 campos de petróleo são responsáveis por metade da produção mundial. Todos eles, no entanto, foram descobertos entre a década de 1940 e a de 1970. Nenhum campo de tamanho comparável apareceu desde esse período. Outras regiões exportadoras surgiram – a Ásia central e a costa ocidental da África -, mas elas não chegam a 6% dos estoques globais. A realidade é que só se descobre um barril de petróleo para cada quatro que são extraídos e consumidos.

Estratégias de controle

Teoricamente, o subsolo do planeta ainda possui petróleo para o consumo durante, no mínimo, um século – cerca de 1,2 trilhão de barris, de acordo com o relatório de 2006 da multinacional British Petroleum. O problema é que essas reservas incluem os combustíveis não convencionais, como o petróleo extrapesado da Venezuela, as areias betuminosas do Canadá e as reservas em locais de acesso extremamente difícil, em alto-mar e debaixo das calotas polares. O gasto para extrair esse petróleo é tão alto que seus preços ficarão inacessíveis.

A queda dos estoques petrolíferos dispo­níveis traz sérias conseqüências políticas e econômicas. Quanto mais escasso é o pe­tróleo, mais importante se torna, do ponto de vista das grandes potências, garantir o controle das grandes regiões produto­ras. É por isso que o Oriente Médio, onde se situam quase dois terços das reservas comprovadas de petróleo, ocupa o centro do tabuleiro geopolítico mundial. Um dos objetivos prioritários da política exter­na norte-americana, desde o choque de 1973, tem sido assegurar o domínio sobre o Oriente Médio. Não é segredo que a grande motivação para a Guerra do Iraque – com seu gigantesco custo econômico, político e humano para todos os envolvidos – é a determinação do governo norte-ameri­cano de controlar o território sob o qual se encontra a segunda maior reserva de petróleo do mundo, atrás apenas da exis­tente na vizinha Arábia Saudita.

China na disputa

Os analistas estão convencidos de que o cenário internacional nas próximas dé­cadas será dominado por uma luta por re­cursos energéticos cada vez mais escassos. Um protagonista central dessa disputa é a China, considerada o mais sério candidato a desafiar a hegemonia mundial dos EUA num futuro não muito distante.

Os dirigentes chineses, nos últimos anos, têm procurado estreitar os laços econômicos e militares com países pro­dutores de petróleo cujos governantes desenvolvem políticas contrárias aos interesses de Washington, como o Irã e a Venezuela_ Dessa forma, a China au­mentaria as chances de garantir o forne­cimento de petróleo na hipótese de um confronto com os EUA e seus aliados.

Enquanto isso, o Brasil amplia seu ca­cife. Torna-se um promissor produtor de biocombustível e continua a descobrir jazidas de petróleo. Desse jeito, no futuro, talvez possa ganhar bastante virando um país exportador de petróleo como nos mostra a figura que segue.

48 thoughts on “O Brasil vai exportar petróleo?”

  1. Parabéns pelo Blog.
    Muito bom mesmo
    Nunca tive essa aula na escola, especialmente eu que sempre estudei em escola pública.
    Você deve saber como ensino no Brasil é deficitário na qualidade e no nível mínimo de conteúdo.
    Valeu mesmo…….

    1. Obrigado Adailton! Gostaria de saber de onde você tecla…
      Sei do ensino deficitário da escola pública, mesmo porque ministrei aulas por muitos anos nas escolas estaduais de Salvador, mas luto contra essa desigualdade e um dos intuitos desse blog é levar informação, inclusive para os que não tem condição de adquirir um livro didático tão caro como é no Brasil (não sei se é o seu caso, mas sabemos que a maior parte dos alunos das escolas públicas não possuem condição financeira para adquirir todos os livros do Ensino Médio – algumas editoras produzem livros mais baratos com menos conteúdo e o Estado fornece, porém, isso reflete diretamente na defasagem do aluno da particular em relação à pública).
      Eu é que mais uma vez agradeço a visita e o convido para navegar em outros assuntos…

  2. Marcos Brandão,
    Muitíssimo Obrigada pela resposta!..me ajudou muito, pode deixar
    que vou sim dar uma olhada nos sites citados. Qualquer duvida que eu tiver volto aqui!
    Atenciosamente
    Carine Urban

  3. O Brasil no momento mais importa ou exporta petróleo?
    Com essa nova descoberta do pré-sal o governo Lula está com o intuito de convencer a população mundial dos benefícios de importar biocombustível brasileiro. E também atualmente a Petrobras vem investindo bastante na produção e publicidade do biocombustível, como ”combustível ecologicamente correto e economicamente satisfatório”.
    Quais são os benefícios que o Brasil afinal terá com o pré-sal??
    Aguardo Respostas!
    Obrigada

    1. Carine,
      O Brasil desde 2006 tornou-se autosuficiente em petróleo e apesar de importar esse produto, a quantidade que exportamos é superior fazendo com que nossa balança comercial seja favorável. Segundo o site http://www.brasiliaconfidencial.inf.br/?p=16607 “O principal item exportado em maio último [2010] foi o petróleo com US$ 1,7 bilhão, um crescimento de 175,4%.” Em barris, dados da Unicamp em 2007 informam que “O Brasil importou 21,125 milhões de barris em julho e exportou 21,217 milhões. Com isso, o saldo líquido ficou em 92 mil barris […] A importação líquida de petróleo e derivados ficou em torno de 10 milhões de barris mensais no período de janeiro a julho.”
      Apesar da importância do petróleo (principalmente depois do pré-sal descoberto em 2007), não esquecemos outras matrizes mais limpas e o maior programa do governo Lula é o etanol (aqui tenho um post para melhor entendimento http://marcosbau.com/591/).
      A importância do pré-sal é ter aproximadamente 50 bilhões de barris com um grau API alto (petróleo mais fino que rende mais derivados), o que significa um petróleo de melhor qualidade do que já extraímos na camada pós-sal e podemos virar só exportadores, pois importamos porque o grau API não nos permite a transformação na quantidade de derivados que precisamos (principalmente diesel e gasolina).
      Enfim, podemos figurar entre os principais exportadores de petróleo do mundo (equivalente a países como a Rússia e a Venezuela). Para um melhor entendimento do processo petrolífero peço-lhe que dê uma olhada no texto, nos gráficos e nos comentários desses dois links que seguem
      http://marcosbau.com/geobrasil-2/entenda-o-pre-sal/
      http://marcosbau.com/geobrasil-2/historico-do-petroleo-foco-no-brasil/

      Espero que com essa resposta, mais os posts você tenha sanado a sua dúvida!
      Até a próxima visita!

  4. O Brasil exporta Gás Natural?? Qual a relação de produção x exportação?
    Ainda não produzimos gás suficiente para atender nossas necessidades??
    Grato,

    Ernani

    1. O Brasil importa cerca de 30 milhões de metros cúbicos de gás natural da Bolívia por ano, pelo gasoduto que começa em Santa Cruz de La Sierra e chega até o Estado do Rio Grande do Sul.
      Com o pré-sal tudo indica que ficaremos auto-suficientes também em gás natural Ernani.

      1. Prezado prof. Marcos Brandão,

        Esses dias estive olhando a “dinâmica” da distribuição de gás natural (leia-se o mapa dos gasodutos) na América do Sul e me parece que a questão da autosuficiência é relativa, pois considerando as diversas utilizações do gás natural e sendo o produto importado barato o suficiente, o Brasil não aparenta estar muito focado em buscar a autosuficiência (e também não tem muita gente para quem exportar aqui na própria América do Sul, suponho eu, a não ser que faça uma guerra de preços).

        Quanto à aproximação por parte da China de países produtores de petróleo com alinhamento político antiamericano como Irã e Venezuela em preparação para um possível (talvez até provável) embate com os EUA, mas que me***, hein? Dois países com bombas atômicas, é o fim do sossego para qualquer um nesse nosso planetinha, principalmente o povo do hemisfério norte.

        1. Olá Rodrigo,
          Para entendermos melhor esse processo energético, o Brasil tem uma dependência de importação de 10,4% do total de energia consumida no país e os destaques de importação estão para a energia de Itaipu que dividimos com o Paraguai e para o gás que importamos da Bolívia pelo gasoduto que sai de Santa Cruz de La Sierra e passa pelos Estados do MS, SP, PR, SC e RS (importante ressaltar que todo o litoral brasileiro até o Ceará está interligado ou por se interligar em gasodutos que já somam mais de 7.000 km). O gás natural ocupa 10,2% da nossa matriz energética.
          O gás tem crescido desde 1998 (de 3,7% da matriz passou a 10,2% hoje), mas não é o nosso foco principal como matriz energética. O que responde por esse crescimento são as hidrelétricas como as que estão sendo construídas dentro do PAC brasileiro: Belo Monte (Rio Xingu no PA), Girau e Santo Antônio (Rio Madeira em RO).
          Quanto ao embate com os EUA, a guerra cambial já está acontecendo desde a crise do subprime norteamericano de 2008, mas temos que separar o comércio internacional dos possíveis conflitos nucleares. Exemplo disso é o discurso do Chavez (e do próprio Jintao) serem contra o modelo de capitalismo americano, mas no campo comercial o capital circula como nunca entre eles (Venezuela comos petrodólares e China com tecnologia americana nas ZEEs), por isso não acredito em fim do sossego por ameaça nuclear. Esse fim do sossego pode vir pelo guerra da acumulação de capital. Vide caso grego e dos PIIGS na crise do euro que serve como um bom exemplo.

          Até a próxima visita por aqui!

      2. Prezado prof. Marcos,

        Terá a globalização trazido como vantagem a mitigação da ameaça nuclear? Alguns analistas consideram como esperada essa mudança de eixo econômico do ocidente para o oriente, o que na minha modesta opinião pode sugerir que as nações estejam orbitando gradualmente mais perto de um ponto de equilíbrio. Mas sou pessimista caso a crise se alastre a ponto de vermos potências nucleares em situação econômica verdadeiramente precária, principalmente as mais ideologicamente radicais (e observando as discussões partidárias nos EUA, me pergunto quais não são).

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