Uma breve análise sobre alguns fatos políticos desde os primórdios do Brasil até a “Nova República”

Por Marcos Bau em meio ao dia 17 de abril de 2016 e algum 19 de agosto, dia do historiador.




Uma breve análise sobre alguns fatos políticos desde os primórdios do Brasil até a “Nova República”, para verificar quantas manobras traiçoeiras (sinônimo de golpe conforme o dicionário Michaellis) o status quo dominante teceu sobre a massa popular. 

Partiu em 9 de março de 1500 e depois de 1 mês e meio de viagem, Pedro Álvares Cabral chegou às terras que chamamos hoje de Brasil, em 22 de abril de 1500, e batizou-as de Ilha de Vera Cruz. Porém, em janeiro de 1500, o espanhol Vicente Yáñez Pinzón já havia pisado em terras brasileiras pela Ponta do Mucuripe, atual porto na cidade de Fortaleza. Portanto, o verdadeiro “achamento” dessas terras, como frisou o jesuíta Caminha em sua carta para a corte portuguesa, foi de quem? Pior é: como você pode achar o que já tinha dono?! Os índios inexistem nesse contexto vil do colonizador, devido ao perpétuo etnocentrismo europeu.

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Fonte: Editora Abril.

Incompetência e corrupção já faziam parte da política brasileira desde seus primórdios. O governo de Duarte da Costa (1553-1558) foi marcado pela desordem e corrupção, tanto que a Câmara da Bahia implorou pela substituição do referido governante. Mem de Sá (1558-1570) o substituiu e foi o governador letrado, corajoso e cruel em sua política de extermínio dos indígenas, combate aos franceses e imposição da lei e da ordem proibindo o jogo, a vadiagem e a embriaguez e estimulando o tráfico de escravos africanos. Todavia, Mem de Sá amealhou a maior fortuna pessoal do Brasil à época, através do tráfico de escravos, fazendas de gado, engenhos de açúcar e exportação de pau-brasil. Seriam Duarte da Costa e Mem de Sá os canalhas dos primórdios da corrupção endêmica que se espalharia pelo Brasil?!

Na segunda metade do século XVII, o bandeirante e genro do também bandeirante Fernão Dias, de codinome Borba Gato, matou um nobre espanhol administrador das minas do rio das Velhas, jogando-o em um buraco. Ficou escondido vivendo no mato e 15 anos depois foi ao encontro do governador do Rio, Arthur de Sá Menezes, para informar a descoberta de minas em Sabará/MG, que estavam em seu segredo. Em troca da informação, o governador perdoou Borba Gato e o promoveu a guarda-mor da região das minas. Dois anos depois, Borba Gato tornou-se superintendente geral das minas do rio das Velhas, basicamente o mesmo cargo que ocupava o fidalgo que ele tinha assassinado. O governador resolveu ele mesmo partir para as minas e ficou por dez meses lá, levando cerca de 600kg de ouro (seria isso também corrupção por uma espécie do clientelismo que iria se perpetuar no bananal?!) e resolveu voltar para Portugal, pois já estava muito rico. Portanto, o que teve início no Brasil colonial perdura no tempo atual, pois na contemporaneidade o privilégio volta-se sempre aos que possuem o poder de mando e mesmo que sejam os mais corruptos, corruptores ou agentes da coação social, continuam sendo a classe dominante, a exemplo das classes política, jurídica e empresarial.

Dom João VI – covardemente – fugiu para o Brasil quando o general francês, Andoche Junot, invadiu Lisboa à frente de um exército de 23 mil soldados e a tomou ao não encontrar resistência. A família real trouxe doze mil acompanhantes e atravessou o Atlântico, chegou ao Rio de Janeiro e confiscou 2 mil casas para alojar os nobres sanguessugas. Em pouco tempo Dom João foi morar em uma casa na Quinta da Boa Vista, ofertada por um traficante de escravos. Tem gente que, apesar desses atos nada nobres, enobrece tal família real por causa das benesses urbanas no RJ, pois a cidade antes da chegada da realeza era precária, suja e fedorenta. Dom João VI – um dos caras mais feios e gulosos de sua época, além de ser muito porco por detestar tomar banho. O rei chauvinista criou ministérios, deu emprego público para seus parasitas acompanhantes e, para manter a mordomia, fundou o Banco do Brasil, além de imprimir papel-moeda sem lastro até mergulhar o país em uma profunda inflação. A mulher de dom João, a espanhola Carlota Joaquina, odiava o Brasil, conspirava contra o marido em prol da Espanha, fumava maconha, colecionava amantes (do seu camareiro a nobres) e foi péssima mãe ao nunca dar importância para o príncipe herdeiro D. Pedro (seu filho favorito era Miguel, cujo pai era o marquês de Marialva). Nesse aspecto, Dom João também tinha seus prazeres sexuais: trouxe um ‘masturbador’ em 1808, que também era seu camareiro chamado Francisco Rufino de Souza Lobato, que o masturbava com frequência e quando foi flagrado nessa ação pelo padre Miguel deportou tal padre para Angola. O chavelho Dom João voltou para Portugal com sua família (menos o filho Pedro), em 1821, depois de saquear/roubar mais de 50 milhões de cruzados do Banco do Brasil e falir o banco por causa disso (agora não há dúvidas que isso seja corrupção!). Antigamente não tinha operação de combate para tentar parar o roubo de empresa estatal e não deixar a empresa falir; hoje até tem operação de combate à corrupção, mas, mesmo assim, roubam e fazem a estatal valer muito menos que valia por causa da endêmica corrupção – vai ver é por causa deles continuarem vivendo aqui, por não terem cidadania lá fora e por isso não podem fugir como Dom João… Pior é que agora, além de responder pelas falcatruas, os ladrões de colarinho branco podem ser presos, coisa que se tornou possível em tempo muito recente e faz os cidadãos honestos (a massa majoritária de trabalhadores que tecem seu labor diário arduamente!) pensarem em se o Brasil um dia ‘terá jeito’ por estar tentando ‘tomar jeito’.

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Dom João VI e Carlota Joaquina.

Em 1821, as Cortes de Lisboa dissolveram o reino do Brasil e daí veio a ordem de volta para o filho de D. João VI, D. Pedro I, retornar a Portugal, por sua presença no Rio de Janeiro tornar-se meramente figurativa. Ao mesmo tempo, as Cortes decidiram que não havia lugar para Dom Pedro I em Portugal e que ele deveria fazer uma viagem por países europeus, a fim de melhorar seus estudos. O fato de ter recebido uma carta de José Bonifácio, assinada pela junta provincial de São Paulo, pedindo para Pedro I não partir, fez o príncipe mulherengo (engravidou até freiras!) e ‘mão de vaca’ ficar no Brasil. Esse episódio ficou conhecido na história como “dia do fico”. Portanto, se o ‘fico’ foi pela carta ou pelo gosto do poder, já que se ele voltasse não seria mais o príncipe comandante, tornado imperador, fica a critério da interpretação do leitor. Se fosse sobre nossos governantes atuais seria óbvia a resposta.

A independência do Brasil, apesar de muitos acharem que foi revolucionária e progressista, na verdade aconteceu como uma ação conservadora (sic). Quem mais contribuiu com dinheiro, armas e homens foram os senhores proprietários de terras, pois o novo ordenamento de país conservaria o privilégio dos abastados latifundiários, as extremas desigualdades econômicas e também continuaria a permitir o regime escravagista. Tanto que várias revoltas por melhoras sociais aconteceram anos depois do 1822, na década de 1830, como: cabanada, balaiada, sabinada, farrapos… Assim, o Brasil, à época, se configurava como a única monarquia do continente e a única nação independente, na qual a economia baseava-se no trabalho escravo. Aliás, o Brasil seria o último país a abolir a escravidão na América e um dos últimos do mundo, só antes de Zanzibar (1897), Etiópia (1942), Arábia Saudita (1962) e Mauritânia (2007). (sic = porque tem gente que acha esse modelo de independência uma ação revolucionária e progressista).

  • Uma pausa para falar sobre a escravidão… A corte lusa, com medo das guerras napoleônicas, foi escoltada pelos ingleses e chegou ao Brasil em 1808. Os acordos de Portugal com a Inglaterra vinham desde os anos 1600 e, em 1810, Portugal assinou um acordo de amizade com a corte inglesa. Por pura questão mercadológica, forçando a implantação da mão de obra assalariada, a pressão inglesa para a abolição da escravidão, por parte de Portugal, sempre foi ativa durante o século XIX, tanto que, desde os anos 1820, foi imposto ao governo brasileiro a abolição antes de 1830, mas a oligarquia rural escravagista que comandava o Brasil foi mais forte. Só em 1850, o Brasil promulgou uma lei de proibição do tráfico de escravos em seu território, a contragosto dos agricultores oligarcas que tinham assinado, no mesmo ano, uma lei de terras para que o status-quo vigente fosse mantido, ou seja, os latifúndios continuassem nas mãos dos mesmos latifundiários. As pressões inglesas e dos abolicionistas continuaram, mas ao invés de assinarmos logo a futura Lei Áurea, ainda adiamos a abolição com leis surreais como a do Ventre Livre (1871 – se que adianta, sendo preto, nascer livre em um país escravagista?) e dos Sexagenários (1885 – surreal de novo, mas fizeram uma lei para tornar livre o escravo que tivesse mais de 60 anos em um país que a expectativa de vida do negro era a metade disso – e a mesma pergunta serve: de que adianta, sendo preto, tornar-se livre em uma país ainda escravagista?). Fomos um dos últimos países do mundo a abolir a escravidão, mesmo assim, depois da Lei Áurea (1888), como a população continuou racista, vieram mais leis tentando amenizar a situação do negro, como a Lei Afonso Arinos, já na metade do século XX, e a mais importante, ou seja, a Constituição de 1988, que tornou o racismo crime inafiançável e imprescritível. Os demais desdobramentos do negro sendo o mais pobre e o mais marginalizado, ainda no século XXI, fazem parte do cotidiano urbano e do noticiário diário brasileiro. Percebam que nem teclei sobre o fato de a oligarquia rural ter permitido que os imigrantes entrassem desenfreadamente no país pela simbologia da “limpeza” da pele pelo branqueamento e pelo mercantilismo de aumentar a concorrência para pagar um salário cada vez mais baixo ao imigrante – uma das premissas de termos formado um mercado interno fraco, se comparado com o dos países ditos desenvolvidos. No Brasil do século XIX, a elite rural aperfeiçoou sua lógica baseada no escravagismo e na exploração extrema da mão de obra para ser perpetuada nos dois séculos posteriores – A elite política, jurídica e empresarial, que se perpetuou como tal desde o século XX, foi da mesma lógica escravagista e de reprodução de privilégios cada vez maiores para essa minoria e assim cresceu o maior problema do Brasil atual, ou seja, a desigualdade social perpetuada e repetida no mesmo status quo da classe do privilégio que, inclusive, ludibria a boba classe média e a faz pensar que ela também faz parte desse privilégio restrito e resumido à elite. O tópico abaixo, de cor diferente, explica essa ideia da classe do privilégio e foi tirada do livro de SOUZA, Jessé. A tolice da inteligência brasileira. São Paulo: Leya, 2015.* O texto cronológico volta após esse adendo.
  • Para Max Weber, os ricos e felizes, em todas as épocas e em todos os lugares, não querem apenas ser ricos e felizes. Querem saber que têm “direito” à riqueza e felicidade. Isso significa que o privilégio – mesmo o flagrantemente injusto, como o que se transmite por herança – necessita ser “legitimado”, ou seja, aceito mesmo por aqueles que foram excluídos de todos os privilégios […] Já para Pierre Bourdieu, o núcleo da dominação social está na tentativa de fazer o dominado aceitar por “convencimento” as razões da própria dominação. Essa produção de “convencimento” é precisamente o trabalho dos intelectuais no mundo moderno, substituindo os padres e religiosos do passado […] A questão seria perceber por que as classes do “espírito”, as classes médias verdadeiras que se apropriam de capital cultural por meio de privilégios nunca tematizados em abordagens conservadoras, são percebidas como superiores às classes do “corpo”, que possuem incorporação mínima de capital cultural. São os capitais impessoais, como o capital cultural e sua apropriação por meio de privilégios injustos que se eternizam no tempo, que condenam à desclassificação social e à miséria tantos brasileiros que se tornam obrigados a vender a força de trabalho por preço pífio. A classe média verdadeira se apropria de capital cultural valorizado ao “comprar” o tempo de estudo dos filhos que podem, ao contrário das classes populares, se dedicar apenas ao estudo. Esse tempo precioso, por sua vez, é literalmente “roubado” dos nossos excluídos, que faxinam, fazem a comida e cuidam das casas de classe média, poupando-lhe tempo precioso que pode ser reinvestido a fim de reproduzir de modo ainda mais profundo seus privilégios de nascimento […] A classe média também é explorada sem disso se dar conta. Temos aqui preços exorbitantes, pagos especialmente pela classe média verdadeira, para serviços de quinta categoria, como nossa telefonia celular. Nossa taxa de lucro e juros é das maiores do mundo e representa uma forma selvagem de acumulação capitalista, isto é, o PIB do Brasil representa quase 70% em ganhos de capital (lucro e juro) – que beneficiam, antes de tudo, meia dúzia de grandes banqueiros e industriais – e reserva pouco mais de 30% para a massa salarial do restante da população ou mais de 200 milhões de brasileiros […] Na sociedade moderna os indivíduos creem em uma igualdade de oportunidades para quem “realmente quer vencer na vida”, mas também isso é, na enorme maioria dos casos, já pré-decidido por vantagens acumuladas desde o berço. A ideologia da “meritocracia”, que resulta desta crença ingênua, transforma constantemente privilégio social em “talento individual” […] O que distancia o Brasil das sociedades que admiramos não é a corrupção do Estado, que é um problema real em qualquer lugar. O que nos afasta das sociedades “moralmente superiores” é que exploramos, aceitamos e tornamos fato natural e cotidiano conviver com gente sem qualquer chance real de vida digna sem ter nenhuma culpa nisso […] Como diz Max Weber, a primeira necessidade das pessoas não é ver a verdade, mas, ao contrário, “legitimar” a vida que efetivamente levam como a melhor possível.* 

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Dom Pedro I, apesar da diarreia que o fez descer do cavalo para defecar no mato, declarou a independência do Brasil (a cena foi bem diferente do quadro acima, pois o animal era uma mula, as roupas eram bem mais simples e imagine dom Pedro I agachado atrás de uma moita com dores de barriga).

Dom Pedro I dissolveu a Assembleia Constituinte e proclamou a Constituição de 1824 de acordo com seus interesses. Sete anos mais tarde, dívidas e desavenças forçaram Dom Pedro I a renunciar em favor de seu filho, de 5 anos, Dom Pedro II. Os liberais reinterpretaram um Ato de 1834 e imprimiram o que ficou conhecido como ‘golpe da maioridade’, para por o príncipe menor de idade no poder.  A Constituição de 1824 afirmava que Dom Pedro II só poderia subir ao trono aos 18 anos de idade, portanto, ter assumido o poder em 1840, aos 14 anos, foi inconstitucional. O primeiro golpe político dado no Brasil e um dos deputados até admitiu que o golpe fosse lamentável, mas necessário em casos extremos e outro achava que todo ato que satisfaz a vontade do povo é legal. Qualquer semelhança com o Brasil contemporâneo será mera coincidência?!

O imperador Dom Pedro II governou por 5 décadas e a instabilidade veio com a disputa política entre liberais e conservadores, além da insatisfação dos militares, 18 meses depois da guerra do Paraguai (1864-1870), que, com a questão militar, uniu os militares para o golpe acontecido dois anos depois. O positivista Benjamin Constant, líder ideológico do golpe militar republicano, junto com o Marechal Deodoro da Fonseca – devido ao ressentimento e revolta pela penúria que o exército vivia no período monarquista – fundaram o Clube Militar em 1887. Deodoro andava mais aborrecido ainda por ter perdido a disputa da amante gaúcha, Maria Adelaide, de seu arquirrival Silveira Martins, que fora nomeado para compor um novo ministério monarca e virou presidente da Província do Rio Grande do Sul, cargo que tinha sido de Deodoro antes de ser mandado para o esquecimento em Mato Grosso e, por isso, abandonou tal posto e voltou para o Rio de Janeiro sem dar grandes explicações ao poder central (Deodoro era casado, portanto, foi o corno que dava corno! Tomou corno da amante e ainda perdeu o cargo que tinha e que foi ocupado pelo mesmo varão da cobiçada Maria Adelaide, seu arqui-inimigo de anos – aí foi demais!). No 15 de novembro de 1889, Deodoro estava doente, mas levantou da cama para montar em seu cavalo e derrubar o Presidente do Conselho de Ministros, Visconde de Ouro Preto, e o regime monarca, porém, não proclamou a república; só concordou com a troca do regime monarquista para o republicano horas depois do golpe do 15 de novembro de 1889, quando o avisaram que o arqui-inimigo Silveira Martins havia ganho ministério pelo imperador. A República foi proclamada na noite posterior por ele doente e deitado em sua cama. Enfim, a monarquia foi derrubada por um golpe militar chefiado por um militar monarquista (Deodoro) auxiliado por outro militar que detestava armas e fardas (Constant) e gostava mesmo de ser professor e estudar o positivismo comteano. Contradições que fazem do Brasil o Brasil!

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“Proclamação da República”, 1893, óleo sobre tela de Benedito Calixto (1853-1927). Acervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo.

Deodoro foi eleito presidente depois de um governo interino, presidido por ele mesmo. O candidato à vice na outra chapa, Floriano Peixoto, teve mais votos que Deodoro como presidente. Em novembro de 1891, Deodoro, inconstitucionalmente (e incoerentemente, como sempre foram os militares na história do Brasil!),  fechou o Congresso por estar indignado com uma lei que permitia o impeachment do presidente. A censura à imprensa (“decreto-rolha”), a política econômica catastrófica do ministro Rui Barbosa, o estado de sítio e o fechamento do Congresso fez Deodoro renunciar após nove meses em exercício, em favor de Floriano Peixoto. Um ensaio de ditadura estava iniciado e viria a se consolidar com o Marechal de Ferro Floriano Peixoto. Militarmente as coisas se repetirão no século que viria com outros golpes de Estado, um ajudado e o outro executado pelos homens de farda…

O governo de Floriano foi inconstitucional, pois a Constituição afirmava que se um governo terminasse antes da metade do mandato, novas eleições deveriam ser convocadas. A oligarquia rural cafeeira chegou à conclusão que os militares deveriam se afastar do poder e, ao final de 1894, Prudente de Morais, primeiro presidente civil, assumiu o poder para tocar a chamada “República dos Fazendeiros”, idealizada por Prudente e consolidada pelo seu sucessor Campos Sales, para favorecer os feudos eleitorais à medida em que o governo central sustentava a oligarquia dos Estados e exigia a reciprocidade (análogo ao fisiologismo da política atual!) – isso instituiu a política do “café com leite”, na qual Minas e São Paulo passaram a se alternar no poder (a oligarquia cafeeira e escravagista foi a que teceu o branqueamento e a concorrência desleal para pagar salários mais baixos aos imigrantes), e teve duração até a Revolução de 1930, quando Getúlio Vargas tomou o poder em um golpe, com a ajuda dos militares. Após combates de quase um mês, os golpistas getulistas tomaram o poder com a deposição do presidente Washington Luís. A instauração do Estado Novo, em 1937, foi mais um golpe sobre dois outros, o da tomada do poder em 1930 e o da eleição indireta de 1934. Resumindo, o golpe do golpe ao golpe de mais ditadura. Nesse aspecto golpista ninguém supera Getúlio! Ninguém anda falando mal dele, pois seu populismo era de conteúdo e qualidade na direção do trabalhador, bem diferente do populismo rasteiro e raso de conteúdo que assistimos nesse século XXI.

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Getúlio Vargas foi deposto em outubro de 1945 e quem ajudou a fazer isso foi o Marechal Eurico Gaspar Dutra, que aderiu à Revolução de 1930, apoiou o golpe do Estado Novo de 1937 e foi ministro de Vargas durante 9 anos. O prêmio da traição foi Dutra virar presidente de 1946 à 1950 (qualquer semelhança com o país contemporâneo é só mera coincidência). A verdade é que, na história do Brasil, o que muito temos são inúmeros traidores, como ratos que pulam do barco quando percebem a eminência de afundar. O jornalista Carlos Lacerda não era do PMDB do século XXI (analogias à parte, pois na verdade nem existia PMDB!), mas é um desses canalhas: apoiou o comunista Carlos Prestes e depois mudou de lado; virou um feroz opositor do governo Vargas em seu jornal e teve o apoio da Rede Globo de Roberto Marinho; este último o fez para alcançar palanque na mídia nacional (Marinho e sua Globo também apoiaria o golpe militar de 1964). Getúlio voltou ao poder, em 1950, com o movimento queremista (queremos Getúlio) e os getulistas sabiam que tinham que dar um jeito no feroz oposicionista Carlos Lacerda. O fiel servidor de Getúlio, Gregório Fortunato, tomou pra si a ação desastrada que tramou a tentativa de assassinato de Lacerda. A terrível falha no tiro, que só acertou o pé de Lacerda, levou ao suicídio de Vargas e adiou o golpe militar que aconteceria dez anos depois.

Uma tentativa de golpe pela UDN e apoiada por Lacerda não conseguiu impedir JK de assumir. Curiosamente, o presidente eleito em 1955, Juscelino Kubitschek, tomou posse pela garantia do general Henrique Lott, pois havia uma conspiração para ele não assumir o posto a que tinha sido eleito. No pleito futuro, Jânio blefou ao renunciar e o tiro saiu pela culatra, pois o povo não saiu às ruas para pedir sua volta como ele previa, muito pelo contrário, a massa popular aceitou sua renúncia pacificamente e o vice Jango, desafeto dos militares que o achavam comunista assumiu, tentando fazer suas ‘reformas de base’. Veio o 31 de março de 1964 e passamos à “modernização conservadora” (ao crescimento do PIB, tudo; ao povo, arrocho salarial e mais nada!) depois de um golpe civil-militar, que, desde o dia da mentira, naquele 1 de abril de 1964, fez o Brasil amargar 21 anos da sua história mais nefasta, que só se findaria em 1985. Carlos Lacerda foi um dos conspiradores civis de grande importância no apoio ao golpe, assim como a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que fez a classe média da época marchar contra Jango e suas reformas sociais pelo medo de perder privilégios em prol dos mais desabastados (agora a classe média sempre e majoritariamente pobre de conteúdo e que pensa ser a elite. Enfim, já escrevi antes que qualquer semelhança com o Brasil atual é só mera coincidência!).

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Carlos Lacerda. Fonte: O Globo.

Os tempos mais recentes da chamada “Nova República”, já andei escrevendo nos últimos tempos e por isso esse escrito finaliza aqui. Quem sabe continuarei em outro momento sobre… A redemocratização com Sarney (o homem que apoiava os militares, mas por raiva do candidato dos milicos ter sido seu inimigo Maluf, voltou-se à democracia por puro interesse pessoal político) e a catástrofe financeira de seu governo em crise, hiperinflação, moratória e alto desemprego; Collor e o pior governo desse período contemporâneo que surgiu como “Nova República”; Itamar Franco, vice de Collor depois do impeachment e o importante lançamento do Plano Real; FHC em seu primeiro mandato da consolidação do Plano Real, pois seu segundo mandato foi um desastre; A era do PT de Lula e Dilma, à qual o primeiro mandato de Lula foi necessário e os outros, tornaram-se notórios que com o aparelhamento de Estado pela extrema corrupção só seriam necessários a partir da alternância de poder requerida em uma democracia e suas devidas e urgentes reformas.

Enfim, o desdobramento foi uma presidente afastada por impeachment em 31 de agosto de 2016 e o vice assumindo como presidente efetivo. O imbróglio foi tão grande que se golpe ou não, a nomenclatura pouco importa, pois os (únicos?!) dois caminhos, defendidos por muitos, foram mais ideológicos do que dentro de uma razoabilidade como projeto de longo prazo e pensado por estadista – o resultado foi catastrófico, sinônimo de bolsonarismo. Resumo-lhes.

Caos: em 2019, Bolsonaro. Lembra da classe média da família com Deus pela liberdade? Da lógica do nada está tão ruim que não possa ficar pior? Sim, estamos vivendo a era da irrazoabilidade, de momentos em que os parvos estão em vantagem e predominando porque são muitos. Em suma, por causa desse quantitativo de atoleimados chancelando sandices, as consequências certamente podem ser (e serão!) irreversíveis. 

Pensou em ressuscitar Dom Pedro II, Getúlio ou JK?! Digo-lhe que com esse material humano do parlamento brasileiro atual, não adiantaria nem ressuscitar o maior líder do século XX. Sim, nem Nelson Mandela resolveria. Se leu até aqui anote para não esquecer: até agora você, povo brasileiro, não é e nem nunca foi o protagonista.  

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