Variações da “estabilidade” (manifestações de 2013)

Esse texto é referente às manifestações acontecidas nas ruas de capitais do Brasil, a partir da cidade de São Paulo, no dia 13 de junho de 2013.

Por Marcos Bau Brandão

O problema é que o povo sempre esteve acordado, mas nunca foi ouvido. Quando começou a ser ouvido, desde meados da década de 1990, os políticos enganaram-no dizendo que o crescimento econômico era de país desenvolvido e a diferença social estava diminuindo em uma velocidade Ayrton Senna, quando, na verdade, a única velocidade intensa que sentiram foi a do avanço da corrupção (independente do partido ou do governo, à exemplo de FHC/Lula).

As manifestações que ecoaram mundialmente desde 2010 pedindo democracia na primavera árabe e mais recentemente na Turquia, pelo não aceite da democracia que é apresentada ao povo, tocaram a nossa chamada classe média e a fez entender que a passividade só tenderia a piorar o processo. Os estádios da copa, a corrupção política, o avanço da inflação, os desserviços: na saúde, na educação e na segurança, associados à indignação de quem paga os maiores impostos do mundo e não tem retorno algum potencializou a revolta e encheu o copo da tolerância… Quando foi acrescentado mais R$ 0,20 ao copo, ele transbordou para a indignação e começou a “contaminar” cada vez mais pessoas, principalmente da classe média que possui maior capacidade de mobilização, hoje também graças às redes sociais. Portanto, a classe média – que estava uma parte dormindo e a outra sonolenta – acordou, se juntou ao povo e foi para as ruas como, desde 2010, nas praças da Tunísia, Egito, Turquia… Mesmo que por motivos diferentes de lá do outro lado do Atlântico. Não há dúvida que fomos influenciados pelo Oriente Médio (já vi a hastag #primaverabrasileira) e, nesse momento recente, pela Turquia. No século XXI, estamos aprendendo que rede social vai além de compartilhamentos, mensagens e curtidas; ela serve também para mobilização, coesão, protestos…

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Quanto ao público do Estádio vaiando Dilma e o corrupto do Blatter (que nem brasileiro é para vir pra cá cagar regra!) – na inauguração da copa das confederações – que pediu educação, ‘fair play’ ou coisa do tipo, percebe-se que até a imprensa já entendeu que falta de educação é a polícia* (totalmente despreparada) agir com truculência e agredir uma manifestação pacífica que estava acontecendo fora do estádio Mané Garrincha (agrediram até quem estava para entrar no estádio – então queriam o que?). Em tempo, de nossa presidente cuidamos nós de protestar contra o que achamos que está errado no país, pois ela foi eleita democraticamente pelo povo brasileiro, mas quanto ao Blatter, não merece o mínimo de nada, pois é só mais um corrupto na Fifa, farinha do mesmo saco de crápulas como Havelange e Ricardo Teixeira (para entender a corrupção recente dos três vide caso ISL e transmissão de tv para a copa do mundo).

Sobre o parágrafo anterior, é importante ressaltar que em Belo Horizonte (8 mil pessoas) e em Curitiba (2 mil pessoas) houveram manifestações contra o aumento da passagem do transporte urbano e em solidariedade às vítimas da violência policial em São Paulo, mas sem violência policial, nem feridos (em Curitiba não teve nem a polícia na manifestação). Sem falar que quando tivemos cem mil pessoas nas ruas do Rio de Janeiro foram contabilizados apenas cerca de 300 baderneiros, número que significa 0,3% da manifestação, que não podemos considerar expressivo a ponto de atrapalhar as reivindicações da maioria.

*O conceito de polícia é atividade de assegurar a segurança das pessoas e bens, sobretudo através da aplicação da lei. A liberdade de expressão é uma das leis basilares da democracia. Na Constituição de 1988, em seu Art. 220º está escrito que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.”

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Enfim, entenda que isso (diretamente) não tem nada a ver com voto ou partido. Aos que pensam assim reducionistamente (geralmente os partidários que só usam um lado do cérebro – dir. ou esq.), você deve dar o exemplo de SP, quando o governo é psdb e a prefeitura é pt. Este escrito versa na direção de que qualquer que seja o partido, a população exige que seja tratada como cidadãos que pagam impostos e por isso exigem, corretamente, serviços de qualidade. Por que temos mania de repetir que na Europa existe cidadania e serviços estatais de qualidade e aqui não? O que vejo nas ruas é um grito, ao mesmo tempo, de todos que se consideram cidadãos estarem dizendo CHEGA ou BASTA! Só a título de informação para os mais ingênuos: as manifestações em Paris, Londres ou outros lugares europeus, também dilapidam o patrimônio público e para isso é que existe a polícia em manifestações, ou seja, para punir APENAS quem está na aglomeração pela baderna ou pelo quebra-quebra. A esses respondo-lhes que sim, a cadeia é o lugar deles.

Quanto a um golpe em curso como pensam alguns, não há a mínima possibilidade e fico com a frase do sociólogo Manuel Castels sobre as manifestações: “não há perigo de um golpe de Estado. Os corruptos e antidemocráticos já estão no poder: eles são a classe política.”

O processo de melhoras sociais que discutimos na teoria, o povo só entende quando sente na epiderme. Desde meados da década de 1990 houve avanços, mas perceba que no censo 2010 foram recenseados 57 milhões de lares no Brasil; 47 milhões possuem renda per capita de até 2 salários mínimos, isto significa R$ 1.356,00, e 2,5 milhões de lares são classificados como sem rendimento. São Paulo contém treze desses 47 milhões de lares e 9,5 milhões de lares têm a renda per capita de até 2 salários mínimos. É desses quase 50 milhões de lares do Brasil que estamos falando. É desses quase 10 milhões de lares em São Paulo que estamos falando, pois são essas pessoas que mais precisam dos serviços oferecidos pelo Estado (educação, saúde, segurança, transporte…). Quero acreditar que quem vai às ruas e está acima dessa faixa de renda, está sendo solidário com seu semelhante.

Exerça seu papel social. Se você é professor como eu informe aos seus alunos o porquê dessa insatisfação geral, apesar dos índices de crescimento que são formalmente divulgados. Guardadas as devidas proporções, no período da ditadura militar também crescíamos economicamente, mas a modernização conservadora não permitia o desenvolvimento social e a ditadura calava a liberdade de expressão. Levante-se, erga-se, defenda-se e até grite, mas conscientize-se e saiba por quais direitos se está reivindicando.

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Pagamos os maiores impostos do mundo, temos a maior diferença social do mundo e, independente de partidos políticos, estamos entre os países mais corruptos do mundo (aqui se rouba em média R$ 60 bi/ano). Não é difícil entender que algo tem que mudar, mas também não é fácil tocar tão ordeiramente essa mudança, pois dentre isso tudo, ainda se tem a ideia de que é claro que líderes dos movimentos mais diversos e que estão infiltrados na manifestação vão se aproveitar disso. Ainda é difícil se ter todas as respostas, então, por hora, lembre-se que não há nada que vença a verdadeira união e a solidariedade.

*As imagens foram retiradas de compartilhamentos do Facebook. Caso tenha direitos autorais é só nos enviar um comunicado para retirarmos.

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