ANTECEDENTES DO CONGRESSO DE VIENA (1814-1815)
Para entender a a convocação do Congresso de Viena e sua significância, torna-se necessária uma volta à queda da Bastilha em 14 de julho de 1789, evento mais conhecido como Revolução Francesa.
Em fins do século XVIII, enquanto a Inglaterra se industrializava rapidamente, a França ainda era um país agrário, comandado politicamente por uma monarquia absolutista, organizado em estamentos (estados ou ordens herdados da Idade Média – clero, nobreza e terceiro estado – este último composto por burgueses, servos e camponeses). No campo as relações ainda eram feudais e nas cidades havia uma pequena inserção de trocas capitalistas.
A luta contra os privilégios da nobreza e do clero, associada às crises acontecidas entre 1786 e 1789 (problemas como: produção de trigo em 1787, produção industrial no final do século XVIII, apoio à independência dos EUA – 1776/81) levaram ao povo parisiense tomar a Bastilha de assalto em 14 de julho de 1789.
Uma nova constituição francesa foi promulgada em 1791 e o grupo dos jacobinos (pequena e média burguesia – liderados por Robespiere) assumiram o poder e o perderam em 1795 para os girondinos (representantes da alta burguesia).
Em 1795, os monarquistas tentaram recuperar o poder na França, mas foram vencidos por um jovem General de 26 anos, Napoleão Bonaparte, que em 1804 – após um golpe de estado – foi coroado Imperador da França como Napoleão I.
O governo napoleônico foi autoritário e pautado em avanços e conquistas para tornar a França a maior potência do continente (vide mapa que segue do Império Francês). Em 1803, a Inglaterra se uniu à Russia e à Austria para lutar contra a França. As conquistas de Napoleão cessaram quando houve a perda de mais de 500 mil soldados para o frio russo, após terem vencido a batalha de Moscou. Seu poderio militar foi totalmente destruído em 1813 quando os governos da Prússia e da Áustria aliaram-se ao da Rússia e venceram Napoleão em Leipzig (na Confederação do Reno**), fazendo-o renunciar na ilha de Elba em 1814. Retoma o poder em Paris em 1815, mas é derrotado pelos ingleses em junho de 1815 na Bélgica (batalha de Waterloo). Foi preso na ilha de Santa Helena, onde morreu em 1821.
** A Confederação do Reno foi criada por Napoleão após destruir o Sacro Império Romano-Germânico que por sua vez foi substituída pela Confederação Germânica, chefiada pela Áustria e com a participação da Prússia e mais de trinta outros Estados da região reminiscentes do feudalismo.
Mapa do Império Francês. Fonte: ARRUDA, José Jobson de A. PILETTI, Nelson. Toda a história. São Paulo: Ática, 2007, p. 334. Clique no mapa para mehor visualizá-lo em outra janela/aba.
Após a derrota de Napoleão em Leipzig (cidade alemã), as monarquias vitoriosas – Áustria, Prússia, Inglaterra e Rússia – convocaram o Congresso de Viena (1814/15). A grande reocupação era restaurar o velho equilíbrio europeu anterior à Revolução Francesa (1789).
O equilíbrio de poder representou, na Europa de século XIX, uma meta de política externa das grandes potências, gerando um período de paz prolongada que só ruiria, em definitivo, com a Primeira Guerra Mundial. Na origem desse período encontra-se a derrota de Napoleão Bonaparte e do seu sonho de estender a hegemonia francesa para toda a Europa – cinco anos antes da batalha de Waterloo, a hegemonia francesa estendia-se pelas penínsulas Ibérica e Itálica e Europa central (MAGNOLI, 2008, p. 40, 41).
O CONGRESSO DE VIENA (1814/15) E SEUS DESDOBRAMENTOS
O Congresso de Viena redesenhou as fronteiras políticas da Europa e reorganizou os Estados através do princípio da legitimidade (sustentado pela articulação diplomática da Rússia, Áustria e Prússia), eliminando os governos oriundos da hegemonia napoleônica.
A Europa pós Congresso de Viena (1815). Na Europa restaurada em Viena, emergia um sistema apoiado sobre a potência insular (Grã-Bretanha), duas potências centrais (Prússia e Áustria), uma potência oriental (Rússia) e uma potência ocidental (França). A segurança britânica baseava-se no equilíbrio entre as potências continentais e nos arranjos que originaram um Estado unitário nos países Baixos e eliminaram a influência francesa na península Ibérica (MAGNOLI, 2008a, p. 113, 115) como mostra o mapa. Fonte do mapa: ARRUDA, José Jobson de A. PILETTI, Nelson. Toda a história. São Paulo: Ática, 2007, p. 337. Clique no mapa para mehor visualizá-lo em outra janela/aba.
Um dos pilares da reunião em Viena era conter o poderio Francês e para isso foram criados Estados com o intuito de uma barreira de contenção – a Suíça recobrando sua independência; no sudeste francês o Reino do Piemonte-Sardenha, que viria a ser o vértice da unidade italiana; no nordeste o Reino dos Países Baixos (Bélgica, Holanda e Luxemburgo).
Outro pilar era manter a fragmentação alemã. No lugar do Sacro Império Romano-Germânico, destruído por Napoleão, surgia a Confederação Germânica.
O príncipe austríaco Metternich*** desempenhou o papel de elo entre a estratégia britânica de equilíbrio de poder e a Santa Aliança (assinada pela Austria e Prússia) proposta pelo czar russo que consistia na ajuda mútua para manter a monarquias “legítimas”. Assim nascia o equilíbrio da Quádrupla Aliança, tornada Quíntupla Aliança em 1818, quando a França aderiu.
*** Como afirma Magnoli (2008a), o gênio político do príncipe Klement von Metternich, primeiro-ministro da Áustria, conduziu seu Estado por um labirinto de arriscadas opções diplomáticas até a consagração geopolítica do Congresso de Viena. No Congresso, a Áustria almejava conservar sua posição histórica e geopolítica na Europa Central e para isso precisava proteger sua identidade alemã e a sua influência entre os Estados alemães, isso tudo evitando que a Prússia se convertesse na potência dominante da Europa.
Em 1820 eclodiram revoltas populares na Espanha e no Reino das Duas Sicílias (hoje Itália), insulfladas por militares liberais contrários ao absolutismo. Em 1823 a Aliança reafirmou o absolutismo nas duas regiões. Mas a Santa Aliança começava a declinar e não conseguiu abafar a rebelião dos gregos contra o Império Turco-Otomano (1821/27) nem impedir a independência das colônias da América do Sul. Criada para bloquear o avanço das forças liberais, a Santa Aliança em 1830 começava a deixar de ter papel relevante.
Outra contribuição para o enfraquecimento da lógica decidida no Congresso de Viena foram as Revoluções de 1848, também chamadas de Primavera dos Povos. Um conjunto de revoluções, de caráter liberal, democrático e nacionalista, foi iniciado por membros da burguesia e da nobreza que exigiam governos constitucionais, e por trabalhadores e camponeses que se rebelaram contra os excessos e a difusão das práticas capitalistas.
A Unificação alemã após vencer a guerra franco-prussiana em (1870/71) também modificaria o poder em todo o continente.
A marcha para a unificação da Alemanha começou em 1833 com a união alfandegária dos Estados Unidos alemães, que tinha por eixo a Prússia e excluía a Áustria. Em 1862, Otto Von Bismarck foi nomeado chanceler da Prússia e inaugurou a fase militar da unificação. Em aliança com a Áustria, a Prússia derrotou a Dinamarca na Guerra dos Ducados (1864). Em seguida, Bismarck assegurou-se da neutralidade da França de Napoleão III e empreendeu guerra contra a Áustria (Guerra Austro-Prussiana de 1866). A vitória prussiana resultou na constituição da Confederação Germânica do Norte e no afastamento da Áustria dos assuntos alemães. Em 1867, a Áustria se uniria à Hungria constituindo o Império Austro-Húngaro.
Em 1870/71 Bismarck travou guerra contra a França e venceu (Guerra Franco-Prussiana). A França, após perder a guerra de 1870/71 para a Alemanha de Bismark, foi obrigada a pagar uma grande indenização à Alemanha, de acordo com o Tratado de Frankfurt, e ceder as províncias da Alsácia e da Lorena, ricas em carvão e minério de ferro.
Em 1891, França e a Rússia concluíram um pacto que prefigurava as alianças da Primeira Guerra. Em 1904 era a vez da França formalizar aliança com a Grã-Bretanha e em 1907 estava formada a Tríplice Entente (Inglaterra, França e Rússia). Em contrapartida a alemanha aliava-se com a Áustria-Hungria, uma configuração geopolítica que prenunciava a Primeira Guerra que teve o seu início quando a Sérvia, que tinha apoio Russo sobre sua expansão territorial (projeto da “Grande Sérvia” – entenda os conflitos da Sérvia nos Balcãs clicando aqui), atenta contra a vida herdeiro do trono austríaco Francisco Ferdinando.
Mapa dos aliados na I Guerra Mundial. Fonte: ARRUDA, José Jobson de A. PILETTI, Nelson. Toda a história. São Paulo: Ática, 2007, p. 456.
Em julho de 1914 a Áustria ataca a Sérvia e a Rússia se articulava para defender seu aliado. Em agosto a Alemanha declara guerra à Rússia.
A guerra destruiu o sistema de Estados erguido no Congresso de Viena. A Alemanha derrotada perdeu parte do seu território pelo Tratado de Versalhes. Os Impérios Austro-Húngaro e Turco-Otomano implodiram, modificando a arquitetura geopolítica da Europa Central e dos Bálcãs. A Revolução Russa de 1917 transformou o antigo império russo na União Soviética.
Mapa de países surgidos no pós I Guerra pelo Tratado de Versalhes. Ressalta-se três exceções do mapa: Albânia e Iugoslávia foram pertencentes e desmembraram-se do Império Otomano (post sobre esse assunto aqui) e o território finlandês que ficou independente pelo tratado Brest-Litovski firmado em 1918. Fonte do mapa: ARRUDA, José Jobson de A. PILETTI, Nelson. Toda a história. São Paulo: Ática, 2007, p. 469. Clique no mapa para mehor visualizá-lo em outra janela/aba.
O mapa da Europa havia mudado. Pelos acordos firmados em 1919, surgiram novos países: Polônia, Tchecoslováquia, Áustria, Hungria, países bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia). Mas o centro determinante da política europeia era realmente a Alemanha. Com a criaçaõ da Tchecoslováquia, por exemplo, a Alemanha perdeu parte de seu território e mais de 3 milhões de habitantes. O mesmo se deu com a Polônia, que se formou dividindo o território alemão pelo famoso “corredor polonês”. Os países vitoriosos encontraram-se e firmaram o célebre Tratado de Versalhes, que foi imposto à Alemanha. Pelo tratado, a Alemanha foi considerada a grande responsável pela guerra (TOTA, 2008, p. 358).
Referências:
ARRUDA, José Jobson de A. PILETTI, Nelson. Toda a história. São Paulo: Ática, 2007.
MAGNOLI, Demétrio. O Mundo Contemporâneo. São Paulo: Atual, 2008.
______. O Congresso de Viena (1814-1815) In: MAGNOLI, Demétrio (org.). História da Paz. São Paulo: Contexto, 2008a.
MORAES, Marco Antonio. FRANCO, Paulo Sérgio Silva. Geopolítica: uma visão atual. 2.ed. Campinas/SP: Átomo, 2008.
TOTA, Pedro. Segunda Guerra Mundial. In: MAGNOLI, Demétrio (org). História das Guerras. São Paulo: Contexto, 2008.
Gostei muito do assunto: Antecedentes do congresso de Viena. “A História foi gravada em placas de ouro para que o tempo não se encarregasse de apagá-las, e que dela aprendêssemos a lição, e que a partir dos exemplos deixados pelos protagonista que fizeram a História, evitemos a cometer os erros cometidos no passado”… Frase: Nelson Nedis Santos de Jesus.
Muito embora eu já conhecia o assunto, o artigo trouxe detalhes que eu não tinha observado como por exemplo: Ao comentar sobre a morte de Ferdinande Príncipe Austríaco alguns historiadores não dizem que a Áustria tomou a iniciativa de atacar belicamente a Servia, e o artigo supra foi preciso em abordar os fatos. Por isso é que eu gosto de navegar no site marcosbau. Parabéns pelo artigo não deixem de publicar assuntos oportunos. Neste momento vou me ater aos pontos positivos do artigo, à frente farei uma abordagem sobre os que ocuparam o poder. O meu muito obrigado.