MAIS OBSTACULOS À PAZ
(Guia do Estudante, 2010, p. 66)
Novo governo israelense defende posições consideradas inaceitáveis pelos palestinos, que, por sua vez, se dividem em um grave conflito entre suas principais organizações.
As Colinas de Golã são um ponto estratégico que possui excelentes recursos hídricos. Israel capturou o território da Síria em 1967 (na Guerra dos Seis Dias) e anexou-o em 1981. Alguns colonos israelenses vivem aqui e desenvolveram a região para o turismo. A Síria se recusa a aprovar qualquer acordo de paz ou a normalização das relações com Israel a menos que as colinas sejam devolvidas ao controle sírio (fonte: BBC Brasil).
Quando se examina o sangrento e prolongado conflito entre Israel e os palestinos, a impressão é que a situação não para de se complicar. Após décadas de tentativas infrutíferas de acordos de paz, há uma situação de impasse sem precedentes. Do lado israelense, o novo governo do primeiro-ministro Benyamin Netanyahu defende posições que os palestinos consideram inaceitáveis até para iniciar conversações. No campo palestino, há uma séria divisão entre as duas principais organizações: o grupo laico Fatah – que dirige a Autoridade Nacional Palestina (ANP), instalada na Cisjordânia-e o grupo islâmico Hamas – que controla a Faixa de Gaza.
O cotidiano de quem vive nessa parte do mundo é marcado por mortes e destruição. O último conflito aberto ocorreu no fim de 2008, quando Israel iniciou uma ofensiva à Faixa de Gaza, com fortes bombardeios e ataques terrestres, que causaram, em três semanas, mais de 1,4 mil mortes. A ofensiva agravou a situação de desastre humanitário existente no território por causa do bloqueio imposto por Israel, que impede a entrada ou saída de pessoas e mercadorias.
Problemas não resolvidos
Para entender essa situação, é preciso recuar no tempo. O marco desse conflito foi a criação do Estado de Israel, em 1948, que provocou a expulsão de milhares de palestinos das terras nas quais viviam. No ano anterior, a Organização das Nações Unidas (ONU) havia aprovado uma resolução apoiando a divisão da Palestina em um Estado judeu e outro árabe, que nunca se constituiu. A nova situação causou desestabilização em todo o Oriente Médio, que tem como uma de suas expressões as guerras entre Israel e nações árabes vizinhas. No decorrer de décadas, houve vários choques armados.
Em 1993 ocorreram os Acordos de Oslo, mediados pelos Estados Unidos (EUA), que traçaram a meta de que a região contivesse dois Estados: um judeu (Israel) e um palestino, esse último formado por duas porções de terras descontínuas – a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, sob ocupação israelense desde a Guerra dos Seis Dias (1967). Os mesmos acordos definiram a criação da ANP, para dar os passos rumo à organização institucional dos palestinos. Nos últimos anos, essa é a perspectiva para a região que dá o tom nas negociações internacionais.
Desde o início das conversas, porém, problemas sérios deixaram de ser resolvidos. Um é a situação de Jerusalém. Os palestinos defendem a ideia de que a parte oriental da cidade, ocupada pelos israelenses desde 1967, seja a capital de seu futuro Estado. Israel não aceita, pois considera a cidade inteira como a sua capital. Outro ponto fundamental para os palestinos não encontra acordo: o direito ao retomo dos que foram expulsos do território israelense. Com a criação de Israel, mais de 700 mil palestinos tomaram-se refugiados. Outra grande onda de deslocamentos ocorreu após a Guerra dos Seis Dias, quando outros 500 mil tiveram de deixar sua casa. Os refugiados, seus filhos e netos, somam agora quase 4,7 milhões de pessoas, segundo a ONU. Esse enorme contingente vive precariamente em campos de refugiados. O governo israelense não aceita debater sua volta, pois o eventual regresso poria em xeque as próprias bases nas quais Israel se assenta.
Assentamentos israelenses
Embora Israel tenha se comprometido com os Acordos de Oslo, manteve a política de criar assentamentos nos dois territórios destinados ao futuro Estado palestino. Colonos israelenses instalaram-se nos locais, expulsando os palestinos, e formaram povoações situadas em regiões de população árabe. Para parte dos religiosos judeus, essas áreas pertencem a seu país desde os tempos bíblicos.
Em 2005, o governo israelense decidiu abandonar a Faixa de Gaza. Retirou todos os 21 assentamentos ali existentes, além de quatro pequenas colônias no norte da Cisjordânia. Para muitos palestinos, a medida não era um recuo, mas apenas um meio de consolidar e ampliar os assentamentos na Cisjordânia – área muito maior e mais próspera que a minúscula Faixa de Gaza. Existem cerca de 300 mil colonos israelenses na Cisjordânia e 180 mil em Jerusalém oriental.
Além disso, desde 2002 Israel passou a isolar as populações palestinas da Cisjordânia, separando vilas e bairros uns dos outros por meio da construção de um enorme muro de concreto. A justificativa inicial era impedir a entrada de terroristas em Israel. Na prática, o muro propiciou que o país anexasse áreas palestinas e hoje restringe a circulação de pessoas e mercadorias pela região.
Cisão entre palestinos
Nessa situação já difícil, o movimento fundamentalista islâmico Hamas obteve estrondosa vitória, em 2006, nas eleições parlamentares palestinas, e indicou Ismail Haniyeh para primeiro-ministro da ANP. Isso teve graves consequências, pois os EUA, a União Europeia e Israel recusaram-se a manter conversações com um governo chefiado por uma organização que consideram terrorista Criou-se um entrave a qualquer tipo de entendimento entre as partes.
Os Acordos de Oslo haviam estabelecido que o governo israelense deveria transferir à ANP os impostos e as taxas cobrados dos produtos importados que entram pelos portos de Israel em direção aos territórios palestinos. Com a vitória do Hamas, Israel deixou de repassar esses valores, como forma de asfixiar o seu governo. As potências ocidentais também suspenderam o envio de ajuda financeira aos palestinos.
Com isso, o Hamas passou a ser pressionado internacionalmente a reconhecer o Estado de Israel, a abandonar a luta armada e a aceitar os acordos assinados anteriormente entre israelenses e palestinos. O grupo islâmico não concordou, pois pretende criar um Estado islâmico em toda a Palestina.
Ao mesmo tempo, as divergências entre os próprios palestinos se ampliaram, e as relações entre o Fatah e o Hamas, que não eram boas, deterioraram-se de vez. Os dois grupos passaram a se enfrentar militarmente, e, depois de inúmeras mortes, uma cisão consumou-se em junho de 2007.
Em clima de guerra civil, o Hamas expulsou o Fatah da Faixa de Gaza e passou a controlar a região. O Fatah manteve-se na Cisjordânia, onde o presidente da ANP, Mahmud Abbas, constituiu um novo governo, tendo como primeiro-ministro Salam Fayyad. Esse governo foi logo reconhecido por Israel e pelas potências ocidentais. Os EUA suspenderam o embargo financeiro, e Israel descongelou os valores de impostos e taxas que estavam retidos.
Netanyahu no governo
Em novembro de 2007, o governo norteamericano patrocinou uma conferência sobre o Oriente Médio em Annapolis (EUA), com o presidente da ANP, Mahmud Abbas, o primeiro-ministro israelense, Ehud 01mert, e representantes de quase 50 países e organizações. No documento final, israelenses e palestinos comprometeram-se a tentar um acordo de paz até o fim de 2008, que assegurasse a existência de dois Estados. Mais uma vez não houve avanços.
O governo de Olmert enfrentava sérios problemas internos. Além de sofrer acusações de corrupção, o primeiro-ministro israelense era criticado por causa da ofensiva militar contra o Líbano em 2006. O ataque, que visava ao grupo xiita Hezbollah, foi considerado um fracasso.
Nas eleições parlamentares, em fevereiro de 2009, nenhum partido obteve maioria significativa. O mais votado foi o Kadima, de Olmert, mas obteve apenas 28 cadeiras de um total de 120. O direitista Likud veio em seguida, com 27, e o ultranacionalista Nossa Casa Israel conseguiu 15. Isso obrigou a uma intensa negociação para a formação do governo. O Kadima, com a maior bancada, acabou na oposição, já que o líder do Likud, Benyamin Netanyahu, costurou uma aliança ampla.
Condições para a paz
O novo governo, diferentemente do anterior, não apoia a política dos “dois Estados” negociada em Oslo. Procura, então, trocar o foco da questão palestina para o Irã, acusando o governo iraniano de ser a principal ameaça à segurança da região, por causa de sua suposta intenção de construir armas atômicas. A situação cria certo atrito com os EUA, historicamente os principais aliados e financiadores de Israel. A política externa do presidente Barack Obama, diferentemente da de seu antecessor, George W Bush, prevê a abertura de diálogo com países considerados hostis, como Irã e Síria, com o que Israel não concorda.
Em maio, numa conversa entre os dois governantes, em Washington, Obama reafirmou apoio à “solução com dois Estados” e pressionou Netanyahu a interromper a construção de mais assentamentos nos territórios palestinos. No mês seguinte, Netanyahu anunciou oficialmente, em um discurso de grande impacto, as suas propostas para um acordo de paz: exige que o futuro Estado palestino seja “desmilitarizado”, não possa controlar suas fronteiras nem seu espaço aéreo. Além disso, deve reconhecer de forma clara Israel como “um Estado judeu” e não firmar acordos militares com Irã nem com o grupo li banês Hezbollah. Com relação à reivindicação de direito ao retorno dos palestinos, o primeiro-ministro disse que é algo a ser resolvido pela comunidade internacional “fora das fronteiras israelenses”. Quanto aos colonos judeus na Cisjordânia, sugeriu que, embora não estejam previstos novos assentamentos, os existentes poderão crescer. Por fim, afirmou que Jerusalém deve ser “a capital indivisível” de Israel.
Tais condições, entretanto, são inaceitáveis para os palestinos. De acordo com o principal negociador da ANP, Saeb Erakat, “Benyamin Netanyahu fala de negociações, mas não nos deixa nada a negociar. Ele anuncia uma série de condições e de restrições que tornam impossível um Estado palestino viável, independente e soberano”. Para um dos as sessores de Abbas, Yasser Abed Rabbo, o governante “empregou a expressão `Estado palestino’, mas quer um `protetorado israelense”‘. O porta-voz de Obama, porém, elogiou o discurso, considerando-o um “importante passo”.Nesse quadro complexo, um plano de paz lançado em 2002 pela Arábia Saudita, e apoiado pelos 22 países da Liga Árabe, tem sido citado como base para um possível entendimento. A proposta prevê a retirada de Israel dos territórios ocupados na Guerra dos Seis Dias e a aceitação de um Estado palestino, na Faixa de Gaza e Cisjordânia, tendo Jerusalém Oriental como capital. Em troca, os 22 países reconheceriam formalmente Israel como Estado judeu. Um representante do governo Obama chegou a manifestar apoio ao plano como base para um acordo. Resta saber se os desenvolvimentos mais recentes dão chance a que a proposta seja seriamente levada em conta.
Saiba mais com um resumo cronológico dos fatos
1897 Fundação do movimento sionista, que propõe o retorno dos judeus à Palestina. Milhares de judeus europeus emigram para a região, parte do Império Turco-Otomano.
1920-1948 Domínio britânico na Palestina.
1939.1945 Segunda Guerra Mundial. Fugindo do nazismo, mais judeus chegam à Palestina.
1947 A ONU propõe a divisão da Palestina em dois países: 56,47% para os judeus e 43,53% para os árabes. Os árabes rejeitam.
1948-1949 Com a retirada britânica, os judeus proclamam o Estado de Israel. Jordânia, Egito, Líbano, Síria e Iraque atacam, mas são expulsos. Israel cresce 75%; o Egito incorpora a Faixa de Gaza; Cisjordânia e Jerusalém Oriental são entregues à Jordânia; os palestinos ficam sem território.
1964 Criação da Organização para a Libertação da Palestina (OLP).
1967 Guerra dos Seis Dias. Israel vence os árabes e ocupa a Faixa de Gaza, a península do Sinai (Egito), as Colinas de Golã (Síria), a Cisjordãnia e Jerusalém Oriental.
1973 Guerra do Yom Kippur. Israel derrota ataque do Egito e da Síria.
1977-1979 O Egito e Israel firmam tratado de paz. O Sinai é devolvido ao Egito.
1982 Israel invade o Líbano.
1987 1a Intifada (levante contra a ocupação dos territórios palestinos).
1988 O Conselho Nacional Palestino aceita o plano de partilha da ONU, de 1947.
1993 Acordo de Paz de Oslo e criação da Autoridade Nacional Palestina (ANP), sob o comando de Yasser Arafat, líder da OLP.
2000 Início da 2ª Intifada.
2002 Muro na Cisjordãnia em construção.
2004 Morre Yasser Arafat.
2005 Mahmud Abbas é o presidente da ANP. Israel remove os assentamentos de Gaza.
2006 O Hamas vence a eleição palestina. Israel ataca o Líbano, visando ao Hezbollah.
2007 Choque armado entre os palestinos. O Hamas assume o poder na Faixa de Gaza.
2008 Israel ataca a Faixa de Gaza.
2009 Israel cessa os ataques a Faixa de Gaza devido à posse do Presidente Obama, para evitar um incidente diplomático com os EUA.
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